28 janeiro 2007

Abortar a capacidade de ser razoável

A conversa da IVG é linda. Existem muitas questões mas parece que pouco se quer falar sobre o que realmente está em causa.

Do lado do não, as argumentações que mais se ouvem são, de que se a pergunta fosse elaborada de outra forma talvez seria melhor e a economicidade da coisa... Bom, fala-se de linguística e de economia portanto. Direito da mulher, isso é algo que definitivamente ninguém quer discutir e que não está nem nunca esteve inserido na nossa matriz cultural, por isso para quê começar agora. Uma vez ouvi o Raúl Solnado afirmar que era um machista porque a sociedade assim o obrigou... Fez-me lembrar o Sean Connery que diz, ao falar da mulher: "I slap her around once in a while to put her in place". Bonito, sempre foi assim e sempre será. A tradição pela tradição.

Mas vamos às duas questões mais faladas:

1 - A pergunta - obviamente que é uma fuga à discussão. Quando não nos restam argumentos, o problema é da pergunta. Se fosse só despenalização, tudo bem, agora a liberalização é que não. Ou seja, façam a cena onde tiverem de fazer, com raspadeiras com pinças e com facas do talho, porreiro. Se morrerem azar, se ficarem impedidas de ter mais filhos, a culpa é vossa e nós lavamos as mãos da coisa. E nem é essa a questão, porque se a pergunta incluisse só a despenalização seria porque a pergunta é incompleta e não contempla a liberalização. No fundo, é não querer mexer com o status quo ao mesmo tempo que se lava a consciência. Eu até nem sou intolerante, apenas tenho dúvidas quanto à pergunta.

Mas assim pergunto eu, tendo dúvidas quanto a uma pergunta, porque então votar não. Essa não é uma assumpção de que percebemos e entendemos a pergunta e que estamos em desacordo com ela... Portanto abstenham-se os linguistas que de repente proliferam no nosso país.

Vamos à segunda, ainda mais patética:

Eu não estou para estar a bancar os abortos dessas devassas. Elas que o façam mas não com a minha guita!
O que apetece dizer perante esta pérola é, WHATEVER!!!
Mas vou tentar elaborar melhor.
Puramente economicista... Se não abortarem num instituto de saúde às nossas custas podem acontecer duas coisas. Ou recorrem ao aborto clandestino ou não abortam. A segunda sai mais cara do que o custo de uma IVG em estabelecimento de saúde pago pelo estado. Só o abono de família por criança de uma família/mulher com condições económicas precárias, em 3 meses cobre o custo da IVG.
A primeira obviamente que é permitir que sejamos um país sem lei. A mensagem que passa é, nós sabemos que existe o crime, e simplesmente não queremos combatê-lo porque não temos guita para tal. Seria o mesmo que dizer, nós sabemos que temos corrupção no nosso país mas quando aparece alguém como o Cravinho que o quer combater, questionamos primeiro a forma (linguistica), e segundo os meios que isso envolve (oops, parece que é isto que também acontece). Ou seja, permanecemos passivos perante a ilegalidade, e assim enviamos sinais a toda a comunidade que nós estamos, no fundo, a cagar para que o nosso país seja o "texas" ou não.

E receber panfletos à porta da igreja e ouvir padres a promover sessões de esclarecimento também me deixa elucidado. É o nosso estado laico em funcionamento. Será que o meu padre poderia fazer publicidade a uma casa que eu tivesse à venda, tipo REMAX? Presumo que não, então porque o faz com um assunto que diz respeito à mulher e não a uma instituição dominada por homens?

Acho que é porque, se o aborto fosse legal há 2000 anos atrás, a "virgem" maria teria abortado, para não ter de mentir ao josé, com a patética história de que tinha sido papada por um anjo...

Isto tudo para dizer obviamente que Sim. Sempre sim, seja a pilula do dia seguite, sejam dez semanas, quinze, dezoito, o que seja. A mulher é quem decide. Se quiser ser ajudada na decisão que seja, mas a decisão tem de ser dela e não de uns legisladores ou fiéis (maioritariamente masculinos) que não se querem ter de preocupar com a situação. E nós temos de dar o direito a alguém, que se encontra sempre numa situação fragilizada, de poder decidir qual o rumo que quer seguir. Não podemos, do nosso conforto, dizer, agora aguenta. Não é saudável e não está correcto.

E só para acabar, para os iluminados que dizem que existem muitas mulheres irresponsaveis no nosso país e que iriam começar a fazer abortos à toa, sugiro que esses se juntem ao Sean Connery e ao Raúl Solnado e que formem um grupo de forcados e que se juntem aos fins de semana para ir à caça e, façam o que fizerem se escusem de emitir opiniões "espertas" sobre o que quer que seja!

1 comentário:

Anónimo disse...

"Acho que é porque, se o aborto fosse legal há 2000 anos atrás, a "virgem" maria teria abortado, para não ter de mentir ao josé, com a patética história de que tinha sido papada por um anjo"

Independentemente da opinião que se possa ter acerca do Aborto, é triste e de muito mau tom ofender a BASE das crenças religiosas de alguém de forma tão baixa...

É assim que vai a esquerda caviar portuguesa.. ofende as maiorias e defende as minorias.. é uma boa forma de estar... para adolescentes rebeldes, não para adultos esclarecidos.

Não resisti a deixar um comment...